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10 de outubro de 2010

25 anos sem Orson Welles


O gênio norte-americano Orson Welles deixou um legado indispensável para entender o cinema. Entre suas obras mais famosas, se destaca o clássico “Cidadão Kane”

Em quase todas as relações de críticos cinematográficos sobre os melhores filmes realizados em todos os tempos, o clássico “Cidadão Kane”, de Orson Welles (1915-1985), figura em primeiro lugar, em grande parte pelas inovações técnicas e a originalidade estilística, além do tema ousado que se inspirou na vida de Randolph Hearst, temido magnata da imprensa americana. O poderoso Hearst ainda tentou interromper a produção e fez tudo para boicotá-la depois de pronta, por considerá-la uma difamação sobre sua vida pessoal, camuflada sob personagens supostamente fictícios.

Orson Welles revelou muito cedo seu extraordinário talento. Foi uma criança superdotada e começou a carreira artística no teatro e no rádio dos Estados Unidos, onde causou pânico nacional ao levar ao ar um dramático programa, concebido como reportagem de intenso realismo, sobre a invasão da terra por seres extraterrenos. Mas tudo era apenas uma adaptação do livro “Guerra dos Mundos”, de H.G. Wells.

Pela comprovada criatividade, Welles teve chance de realizar seu primeiro filme, em 1941, cercado de condições excepcionais: a produtora R.K.O. lhe concedeu independência total para dirigir e interpretar “Cidadão Kane”, com a preciosa colaboração do inventivo fotógrafo e roteirista Gregg Toland, a quem é atribuída uma expressiva parcela de participação (para alguns tão importante quanto a de Orson) na elaboração da obra como um todo.
Na época, Toland declarou em entrevista: “Quando trabalhamos juntos no roteiro, imaginamos que, se possível, a fita deveria fazer com que os espectadores estivessem assistindo a uma realidade, e não meramente a um filme. Preparamos previamente nossos ângulos e composições, a fim de que a ação pudesse ocorrer simultaneamente em pontos distantes, situados em primeiro plano e no fundo do quadro”.

Estilo impactante

Filmada em preto-e-branco, com muitos planos escuros e fundo acinzentado, razão pela qual é considerada bastante influenciadora do então nascente cinema “noir”, com o qual também apresenta a analogia da narrativa em “off”, a impactante criação de Welles impôs um estilo visual bem particular, com grandes angulares deformando expressões faciais, monumentos e paisagens; cenários barrocos e incisivos primeiros planos sobre rostos geralmente amargurados. Até hoje, as principais técnicas de narrativa cinematográfica são quase todas calcadas nas inovações introduzidas por Welles há quase 70 anos.

Sob outros aspectos, “Cidadão Kane” é um filme de investigação e uma descrição ousada sobre as relações escusas entre o mundo político e certo tipo de imprensa, tema bastante atual e facilmente comprovado, a cada dia, inclusive na presente realidade brasileira.

O castelo de Xanadu, onde mora Kane, nada mais é do que a ainda tão presente materialização dos desejos de milionários megalomaníacos e de profundo mau gosto, assessorados por arquitetos servis, em verdadeiros monumentos consagrados ao que o “kitsch” tem de pior. Um dos únicos senões atribuídos ao filme seria certa falta de identificação emocional entre o espectador e os personagens, que não emocionam ao ponto de estabelecer uma relação de amor ou aversão, sendo mais conduzidos pela qualidade de composição das imagens do que por sua real empatia com o público.

Apesar de subestimado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que o ignorou na categoria de melhor filme e preferiu agraciar “Como Era Verde o Meu Vale”, uma obra menor do diretor John Ford, “Cidadão Kane” é hoje objeto de estudo constante nas mais importantes escolas de cinema, sobretudo no tocante ao emprego da profundidade de campo, das tomadas ampliadoras de ângulos e, também, quanto às transparências e iluminações.

O sucesso extraordinário de crítica obtido pela primeira realização de Orson Welles só fez despertar inveja e desconfiança a seu respeito, tendo o cineasta sido bastante descriminado por tentar filmar, a qualquer preço, algo que fosse bem além das banalidades então imperantes nas telas americanas. Depois de ter seu excepcional filme “Soberba” literalmente mutilado pelos produtores, viu-se obrigado a interromper as filmagens de “It’s All True”, um semidocumentário que ele realizaria no Brasil. Em Fortaleza, Welles chegou a filmar boa parte de um dos episódios da produção, tendo como tema a saga dos jangadeiros cearenses em sua épica viagem até o Rio de Janeiro. A falta de sorte do cineasta esteve presente até na inesperada morte do pescador Jacaré, vítima fatal de um acidente ocorrido em estranhas circunstâncias durante as filmagens.

Amado e incompreendido

Fã incondicional do teatro de Shakespeare, Orson Welles levou à tela as peças “Macbeth” e “Othello”, realizações internacionalmente premiadas em importantes festivais, apesar de realizadas em condições precárias e com baixíssimos orçamentos, penosamente conseguidos depois de muito empenho do cineasta, que muitas vezes teve de submeter-se a interpretar pequenos papéis em filmes insignificantes, só com o objetivo de obter capital para suas produções. Uma das exceções foi sua irretocável aparição em “O Terceiro Homem”, de Carol Reed, no qual ele se torna a mais impressionante presença de todo o filme interpretando um personagem que, apesar de mover o eixo da trama, aparece em cena apenas por poucos minutos.

Mesmo lutando com imensas dificuldades, Orson Welles conseguiu realizar filmes magníficos, entre eles “A Dama de Shangai”, ao lado de sua então mulher Rita Hayworth, onde ele, numa de suas falas, faz uma menção a supostos tubarões existentes nas praias de Fortaleza. Também muito marcantes, na história do cinema, são “A Marca da Maldade”, com Charlton Heston e Marlene Dietrich, um dos mais instigantes filmes no estilo “noir”, sobre um xerife desonesto que fabrica provas contra os que julga culpados, sob o pretexto de ajudar a Justiça, e “O Processo”, onde conseguiu reproduzir à perfeição a atmosfera deprimente e as imagens desconcertantes suscitadas pela obra do escritor Franz Kafka.

Mundialmente reconhecido como um dos maiores criadores da história da Sétima Arte, Orson Welles morreu deprimido, pobre e sem encontrar trabalho. Pouco antes de sua morte, concedeu à imprensa uma entrevista comovente e desesperada, na qual relatava as dificuldades para angariar uma mínima soma que o possibilitasse a realizar seu último filme, que ele nem mesmo conseguiu começar.

Filmografia:

1934 - Hearts of age (curta)
1938 - Too much Johnson (curta)
1941 - Cidadão Kane (Citizen Kane)
1942 - Soberba (The Magnificent Ambersons)
1942 - Jornada do pavor (Journey into fear)
1946 - O estranho (The Stranger)
1948 - A Dama de Shanghai (The Lady from Shanghai)
1948 - Reinado de sangue (Macbeth)
1949 - Memórias de um mágico (Black magic)
1952 - Othello (The Tragedy of Othello: The moor of Venice)
1955 - Grilhões do passado (Mr. Arkadin)
1955 - Moby Dick rehearsed (TV)
1956 - Orson Welles and people (TV)
1958 - A Marca da Maldade (Touch of Evil)
1958 - The Fountain of youth (TV)
1958 - Portrait of Gina (TV)
1960 - David e Golia
1962 - No exit
1962 - O Processo (Le Procès)
1965 - Campanadas a medianoche
1968 - História imortal(The Immortal story)
1968 - Vienna
1969 - The Merchant of Venice (TV)
1970 - The Deep
1971 - London
1972 - The Other side of the wind
1975 - Vérités et mensonges
1984 - The Spirit of Charles Lindbergh
1992 - Don Quixote

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